Quantas vezes você já ouviu falar que ESG é tendência e não moda? Mas você entende o que significa dizer que ESG é tendência?
Antes de afirmar se é tendência ou moda, a gente devia refletir sobre o conceito de cada uma dessas coisas:
Modismo, moda e tendência são conceitos diferentes.
Conceitos de modismo, moda e tendência
Vamos lá:
Modismo (ou ondas)
Vem com um impacto grande, mas dissipam-se rapidamente. As pessoas incorporam-nas sem entenderem muito bem porquê.
Modas
Incorporadas de forma consciente na rotina diária. Não acarretam em mudanças de comportamentos. Têm um impacto instantâneo menor que o modismo mas duram mais tempo.
Tendência
Resultado de uma mudança de comportamento. Começa de forma mais tímida que a Onda e que a Moda, mas a sua duração é grande e com impactos profundos. Assumida como uma mentalidade emergente e dominante.
(fonte de referência: Trend Academy 2010/2011, Autores: Teresa Paiva e Luís Rasquilha Editor: Instituto Politécnico da Guarda)
Diferença entre modismo, moda e tendência
Assim, podemos entender que tendência é uma série de fatos que acontecem sistematicamente e vão influenciar o comportamento de um grupo de pessoas ou população daqui para frente.
A onda é algo que acontece pontualmente, tem uma rápida ascensão e se dissipa muito rápido. A moda é algo que começa já em alta, se mantém por um determinado tempo e cai em desuso, após determinado tempo.
A tendência é a combinação de vários assuntos, temas, pequenos comportamentos e discussões da atualidade que perduram e vão influenciar o comportamento dessas pessoas. O modismo e a moda não mudam os comportamentos, nem pautam atividades futuras em consistência.
ESG é tendência, não modismo
Sendo assim, quando falamos de ESG, para entender melhor porque afirmamos que ele é uma tendência, é importante entendermos o contexto histórico, o comportamento do campo de impacto socioambiental onde ele está inserido e a construção que vem sendo impressa nas empresas desde o meio do século XX.
No post Retrospectiva histórica que nos leva ao ESG, a gente constrói uma linha do tempo que ajuda a compreender porque a prática de ESG já vem sendo construída há muitos anos.
Retrospectiva histórica que nos leva ao ESG
Sugerimos uma retrospectiva histórica desde os meados dos anos 50 – período já um pouco mais consolidado de pós Segunda Guerra Mundial.
Filantropia na primeira metade do século XX
Nos anos 60, a atuação das empresas tinham um caráter mais filantrópico. Os grandes assuntos sociais que estavam sendo discutidos eram em 1948, a declaração dos direitos humanos foi publicada; a discussão em volta do tema do Apartheid e a segunda onda feminista que estava já consolidada.
Anos 70 e o início responsabilização
Vamos até os anos 70. O termo que começou a ser usado pelas empresas foi “responsabilidade social empresarial”. As grandes temáticas eram o Estado de Bem-Estar Social, e dois acontecimentos vão influenciar o campo dali pra frente: em 1972, o PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente foi criado; em 1973, o primeiro crash petróleo, em 1977 preço do barril subiu absurdamente; e em 1979, aconteceu o maior derramamento de óleo já registrado até então.
Anos 80 e o ambientalismo
Chegando nos 1980 a questão ambiental passa a ser incorporada ao discurso das empresas e o termo “responsabilidade ambiental empresarial” passa a ser mais utilizado. Os anos 80 foram marcados por uma crise econômica mundial e, aqui no Brasil, foi chamada de década perdida. Os países da América Latina, de maneira geral, tinham grandes dívidas externas e no Japão, uma das maiores crises imobiliárias já resgistradas, abalou o mercado financeiro.
A era da sustentabilidade começa nos anos 90
Em 1990, o tema que estava corrente nas empresas começa a ser “sustentabilidade”. Algumas ferramentas e temas discutidos até hoje, nasceram nos anos 90. O índice de desenvolvimento humano, o IDH foi lançado em 1990 e discutido amplamente. O social return on investments – o ROI – foi lançado em 1995. Este conceito foi passando a integrar, ainda que de maneira modesta, as discussões das empresas. Tamém foi nesta década que o índice de sustentabilidade da Dow Jones foi lançado e passou a participar das discussões no mercado financeiro.
Em 1992, aconteceu a ECO-92, a Agenda 21 foi lançada e o protocolo de Kyoto foi assinado em 1997.
Triple Bottom Line, a germinação do ESG
Já nos 2000s, o termo da sustentabilidade passa a ser bastante conhecido e difundido especialmente como “Tripé da sustentabilidade” (Triple Bottom Line), principalmente devido às publicações do inglês John Elkington que começaram a influenciar as grandes empresas. Além disso, na carona da Dow Jones, a Bovespa lança também o seu índice de sustentabilidade. Acontece em 2002, na África do Sul, a Rio+10, quando são lançados os ODMs, os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.
Neste documento de 2005, você pode ler sobre a interação da Agenda 21 e dos ODMs no Brasil.
Os dias atuais: ESG e sua tendência
Finalmente, na última década completa que temos, os anos 2010, o termo mais utilizado e difundido pelas empresas e pelo mundo corporativo passa a ser “responsabilidade socioambiental empresarial”.
A discussão que Porter traz, com relação a “valor compartilhado” ou as também chamadas “relações ganha-ganha” passa a fazer parte das reflexões e das atitudes de boa parte das empresas corporativas. Também acontece no próprio Rio de Janeiro a Rio+20, a “remodelação” dos ODMs, com o lançamento dos ODSs – Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis. O acordo de Paris foi assinado e a temática do “setor 2,5” e do “Movimento das Empresas B” passa a dominar o campo do desenvolvimento socioambiental, e se difundir com rapidez no campo corporativo.
É possível ler neste post uma boa e simples prática de ESG nas empresas: acessibilidade.
ESG é moda!
No início dos anos 2020, exatamente onde estamos no momento deste texto, já neste breve período, temos alguns indícios de que o termo “ESG” é um termo da moda. Mas espera! Por que foi dito antes que ESG é tendência e não é moda? E agora, está afirmando que é moda?
Sim. ESG é moda.
Mas não vamos confundir o termo com a prática.
A construção histórica, que apresentamos neste post, sobre a incorporação das questões socioambientais no campo das empresas e das corporações, mostra claramente que as práticas de ESG não são uma moda, mas sim uma tendência de todo o último século.
Lembrando dos conceitos de tendência e de moda, as práticas que envolvem ESG são tendência, porque têm transformado o comportamento e o modo de gerir nestas organizações. Mas o termo ESG é uma moda.
Em 2020, percebemos claramente que o termo ESG foi amplificado e potencializado pelo acontecimento que provavelmente vai marcar todo o século 21: a pandemia.
A COVID e a aceleração de ESG como tendência
Segundo a PWC, a pandemia de COVID-19 foi uma das maiores crises de saúde da história moderna. À medida que os consumidores mudaram e adotaram novos hábitos, os líderes empresariais se perguntavam se essas mudanças, que aceleraram as tendências já em movimento, seriam passageiras ou permanentes. A Price realiza periodicamente uma pesquisa global sobre tendências para gerar insights de mercado. Essa pesquisa se chama “Global Consumer Insights Pulse”. da PwC de junho de 2021 revela que as mudanças estão persistindo – significando uma mudança histórica e dramática no comportamento do consumidor.
A pesquisa de Consumer Insights da PWC mostra que entre outubro de 2020 e março de 2021, os consumidores evoluíram para ser ainda mais digitais e mais ecológicos. Outras tendências claras percebidas é que consumidores, de maneira geral, também estão mais preocupados com os preços, estão mais saudáveis, mais preocupados com o uso de dados e se relacionando mais localmente.
Além disso, acreditamos que podemos também novas práticas cada vez mais incorporadas no mundo dos negócios, como equity crowdfunding, que pode ser traduzido como financiamento e participação coletiva em empresas. (Se você nunca ouviu falar, leia mais sobre isso em um verbete que a Draft definiu ainda lá em 2015). Esta modalidade de investimento tem se tornado cada vez mais frequente e comum, nem tanto só nas empresas de grande porte, mas também como meio de financiamento alternativo para empresas de pequeno porte ou startups que estão crescendo.
O tema da diversidade, racial, sexual e de gênero, etária, cultural, funcional, religiosa e todas as outras, tem se mostrado cada vez mais forte, como pode ser visto de maneira bem emblemática com os movimentos negros, com a quarta onda feminista e todas e todas as manifestações em prol dos direitos LGBTQIA+.
Nesta década, também não podemos esquecer que está no horizonte mundial uma grande crise energética. Para resolvê-la, parece que a única possibilidade de solução está nas energias sustentáveis e renováveis.
O enquadramento das práticas de ESG como tendência
O que gostaríamos de mostrar com toda essa construção é que a inclusão nos resultado das empresas da discussão sobre os problemas e os impactos sociais, os problemas e impactos ambientais e sobre a maneira como se toma decisão (governança) não é algo novo. Não é algo novo e não é algo passageiro. Só se fosse passageiro, ESG seria uma moda.
A noção de que ignorar as questões sociais, ambientais e de governança é prejudicial vem se construindo ao longo da segunda metade do século 20 e vem se consolidando agora no século 21.
Não há mais alternativas para as empresas se manterem de pé, funcionais e gerando lucros para os acionistas e gerar valor para toda a sua cadeia, se elas não discutirem e considerarem as questões e temas que o termo da moda ESG tem colocado em destaque.
Se as empresas estão tão interessadas e conscientes disso, é necessário que organizações de impacto socioambiental se atentem a como as empresas entendem a temática.
Como olhar pra essa “moda” do ESG , que já sabemos que, na verdade é a tendência de ESG?
Como olhamos na perspectiva das empresas e podemos colaborar com as necessidades das corporações usando a expertise do campo de impacto?
Projetos socioambientais e a tendência de ESG
Principais temáticas abordadas em ESG relevantes para organizações sociais, podemos listar alguns dos principais temas.
Abaixo, listamos em cada um dos três grandes blocos de ESG algumas temáticas mais influentes que acreditamos que podem se conectar – de muitas maneiras – com a atuação das organizações de impacto socioambiental que executam projetos e tem intenção de se conectar com as empresas que, cada vez mais, estão atentos à discussão.
Temáticas Ambientais de ESG (E = Environmental)
No campo ambiental, podemos listar alguns alguns temas principais como
- energias sustentáveis, combustíveis fósseis;
- eficiência nos transportes;
- biodiversidade;
- preservação da água;
- emissões de gases e lixos, efluentes e resíduos de maneira geral;
- e uso e moderação de materiais de produção.
Temáticas Sociais de ESG
No campo do impacto social, alguns dos grandes temas são:
- práticas e condições de trabalho decentes;
- direitos humanos;
- participação social e cívica;
- responsabilidade do impacto social gerado pelos produtos e serviços;
- diversidade.
Temáticas Governança de ESG
No campo da governança, ou seja da moderação da tomada de decisão das organizações, alguns grandes temas são:
- construção e uso de código de ética e de conduta;
- importância e função de um conselho de administração;
- a remuneração dos grandes executivos e a disparidade de salários internos;
- direitos de acionistas minoritários;
- prevenção à corrupção e aos conflitos de interesses que influenciam em temas sensíveis.
A influência do mercado financeiro para consolidar ESG como tendência
Acreditamos que ESG tem se mostrado tão forte como uma sigla sinônimo de várias práticas, porque vem sendo abordada e pautada inclusive (e quizás, principalmente) no campo das finanças. ESG vem com tanta força, porque começou-se a aperceber que se não forem discutidos e transformados comportamentos relacionados a esses três temas, a sustentabilidade financeira das empresas e dos fundos de ações, não será consistente – sequer possível!
Com bastante influência aqui no Brasil, a força de investidores externos têm conduzido essa discussão para outro nível. É muito importante para esses atores que se discutam e que sejam aparentes e transparentes como as empresas têm lidado com as temáticas listadas para tomarem decisão relativa ao investimento dos seus recursos.
Para nós aqui do setor, campo, ambiente (chamem como quiser!), o setor de impacto socioambiental, acreditamos que é um exercício olhar e perceber o que é ESG do ponto de vista das empresas. Neste exercício o que é relevante de ser feito é:
- notar que hoje, diferente do passado, as práticas sociais, ambientais e de governança passam a ser cada vez mais um investimento interno das empresas e não uma prática para a qual elas reservaram uma parte do seu Budget para investir, como se fosse algo “de fora” da realidade delas.
- refletir e compreender quais são as estruturas destas empresas com as quais a gente quer se relacionar.
- como a empresa consome os elementos de ESG;
- e por fim, compreender como a tendência das práticas de ESG influencia a estrutura da empresa.
O que projetos socioambientais têm a ver com a tendência do ESG nas empresas?
Como já dissemos, é necessário que a gente mude o ponto de vista e comece a entender como as empresas têm encarado os temas relacionados às práticas de ESG.
Aqui, nós do campo de impacto, já estamos bastante acostumados e mergulhados diariamente especialmente nas temáticas ambientais e sociais há muitos anos. É o nosso setor um dos principais responsáveis por influenciar e pautar esses assuntos, desde o início do século 20. As empresas não estão mergulhadas nessas temáticas diariamente e questões que para nós parecem muito básicas, são situações novas e das quais as corporações ainda precisam e querem se inteirar. As grandes empresas estão se interessando apenas agora por elas.
Alguns diriam que o interesse pelas temáticas por parte das empresas é utilitária. Diriam que a intenção delas é apenas garantir que a sustentabilidade financeira e que os lucros dos acionistas não sejam prejudicados.
Sim. Pode ser que seja uma visão utilitária. Muito provavelmente até é este o motivo pelo qual o termo está tão na moda e tem sido tão discutido nos últimos anos. No entanto,em uma visão mais pragmática, é melhor que assim seja e que entendamos que estamos em um processo de longo prazo, na jornada de influenciar a atitude das organizações no que se refere aos temas que são relevantes para a sociedade.
Acreditamos que a “tendência de ESG” está, aos poucos fazendo com que as empresas compreendam que para suas atividades comerciais continuarem existindo é necessário que seja indivisível três questões:
- a preservação e manutenção do meio ambiente e dos recursos naturais;
- a garantia da qualidade de vida de todos os seres humanos na terra; e
- a determinação e a prática concreta de valores que os guiem suas ações.
Definitivamente, não é o termo que vai ser utilizado que importa.
Chame ESG do que quiser
Chame do que quiser: ESG, sustentabilidade, impacto socioambiental, ou qualquer outro termo (aí, sim), da moda. O importante é que o conceito e as práticas relacionadas ao tema sejam incorporados no comportamento dos líderes gestores fundadores e acionistas das empresas – e no longo prazo, quem sabe, mude consistentemente a lógica de exploração e abusos das organizações.
Assim, hoje, quando trabalhamos com projetos socioambientais, nossa tarefa é olhar para como essas empresas estão usando esses temas e termos e olhar para nossa capacidade, nosso potencial, nossos conhecimentos, experiência e práticas para identificar como nós, que já vivemos fazendo tudo isso, podemos colaborar, influenciar e, por vezes, determinar o que essas organizações vão fazer. E assim, direcionar de maneira mais consciente, baseada em dados, como as organizações vão investir os seus recursos.
E como muda a maneira como enxergamos projetos de impacto socioambiental?
Nossa sugestão é que tentamos fazer um uma espécie de “de – para” dentro dos temas que mais mobilizam as empresas. Não que tenhamos que mudar o que fazemos para nos adequar aos temas, mas sim, refletir sobre em quais deles estão nossas potencialidades e habilidades e, assim, nos disponibilizar, por meio dos projetos que jé executamos, para colaborar com as empresas na solução dos problemas relacionados a cada assunto.
Se quiser ajuda para pensar sobre isso na sua organização, é só falar com a gente.